terça-feira, 14 de abril de 2009

PAIXÃO: EXISTE RECEITA?

Sempre tive curiosidade em desvendar os segredos do coração, já que nunca me apaixonei ou pior, nunca amei verdadeiramente alguém na vida, mas esta curiosidade sempre foi protelada e esquecida em segundo plano ao longo da minha vida, uma hora por não ter tempo, outra por não ter "saco" mesmo; Porém, vejo-me verdadeiramente apaixonado por uma pessoa, e sei que este sentimento só cresce em mim, sei também que não trata-se de uma simples paixão, portanto, tendo esta motivação como combustível para minha velha curiosidade sobre o assunto, resolvi pesquisar sobre tal tema e descobri que há pouco uma revista científica, mais precisamente de segmento "neurocientífico", apontou as possíveis causas para a paixão, mas não tão somente isso, apontou ainda um tipo de "receita" para fazer com que este sentimento humano dure, mas eu pegunto, será que há uma receita para essas coisas? paixão não seria uma coisa efêmera? então se durar não é paixão, certo?
Bom, vejamos um artigo denominado "Para viver um longo amor", de Suzana Herculano-Houzel. JC online de 22 de Janeiro de 2009; também publicado na Folha de S. Paulo:



"A neurociência, no entanto, é uma jovem senhora de mais de 150 anos de experiência e com vários conselhos para dar. Se ela hoje sabe que a paixão é um estado particular de intensa ativação do sistema de recompensa associada à visão, presença ou mera ideia da pessoa amada, então manter a paixão consiste em... manter a associação entre a tal pessoa e a ativação do sistema de recompensa. Ou seja: associar prazer ao amor"



A fórmula é a de associar o amor ao prazer. Ora, mas os filósofos não disseram isso, de modo menos grosseiro, lá na Grécia Antiga? E eles tinham uma grande vantagem, além a de serem bons filósofos. Eles sabiam que aquilo que estavam dizendo não era uma sabedoria que o senso comum desconhecia. Eles a enfatizaram, sim, mas não de modo a empobrecer o caso, como no artigo aqui citado. Eles a enfatizaram porque a questão era a de dar combate aos que teimavam em ver suas "filosofias da paixão" como um culto aos prazeres exagerados. Eles aliaram o amor e prazer na medida em que mostrou que o amor é o prazer e, se se quiser, vice versa.


A idéia não era a de enaltecer de maneira reducionista os sentidos. A idéia era a de mostrar que a educação dos sentidos, o que nos faz beber o copo de água na exata medida da nossa sede e, então, obter o verdadeiro prazer, é algo que leva uma vida para se conseguir. Desse modo, não há propriamente uma fórmula para o amor e para a ampliação da duração da paixão. Muito menos há uma maneira de falar da paixão como se pudéssemos mapeá-la em termos comportamentais e, então, criar um conjunto de estímulos regrados que a fizessem se manter. Pois Epicuro estava certo quando lembrou que, para aprender essa sabedoria do ele chamava de hedonismo, que é de saber tirar prazer do mundo, o melhor seria que as pessoas se retirassem para o seu Jardim, e vivessem ali como amigos. Além disso, ele sabia bem o que era a paixão, e ele jamais errou na sua definição. Por definição, paixão não é o que dura.


Por que Epicuro soube falar sobre o assunto com propriedade? Por uma razão específica: não é o casamento ou a vida ou bulas de jogadores de búzios universitários que criam a duração da paixão. Muito menos a filosofia. Nada cria a duração da paixão. A duração da paixão é uma mentira. Só um inexperiente de relações amorosas vê uma paixão durar. O que dura é a potencialização do prazer sexual, a ampliação do companheirismo e o aumento (justificado ou não) da confiança. Esses três elementos agrupados tornam a paixão algo secundário. Pois, no conjunto, se apresentam como mais fortes e poderosos do que a paixão. Chamaria então, este sentimento mais "maduro" de AMOR. Como esses elementos demandam aprendizado, experiência e não experimento somente, os hedonistas de boa estirpe não os viram como possíveis senão em um ambiente, o do tipo do Jardim.


Nesse ambiente, e por meio desse cultivo da filosofia hedonista, o prazer seria cultivado enquanto prazer. Caso eu beba um copo de água e ganhe uma gota a mais do que eu preciso para gostosamente saciar a sede, eu não soube tirar prazer de um pequeno evento. Não tenho capacidade para o hedonismo. Nesse sentido, falta-me sabedoria. É isso que Epicuro quer daquele que vem ao seu Jardim. Isso é o que ele acredita que se pode aprender, e que se pode aprender também para o caso do amor. Ora, a paixão é diferente disso, do que se pode aprender. Ela é um impulso forte, um fogo nas entranhas que, caso não se apague, jamais será reconhecida como paixão. A paixão só é paixão porque acaba. Tem de acabar. O próprio nome já diz: pathos, o que cai sobre você, o que o arrebata. Você sofre paixão, você não atua na paixão. Na paixão, você é passivo, você é pego por ela, e um belo dia, com a sua colaboração, ela se vai. Quem não passou por isso vai ficar na "neuro-militância", mas jamais vai entender o que é a paixão.


Quando casais maduros dizem que estão ainda apaixonados e que até se amam mais do que no início, eles não estão usando a palavra paixão no mesmo sentido que a usufruíram no inicio. Aliás, estão usando a palavra de modo errado. Caso olhassem no dicionário, saberiam que cometeram um erro. Eles estão usufruindo do conjunto tripartite que eu apontei, que é bem mais gostoso e completo que a paixão: sexo bom a caminho de melhorar, companheirismo e confiança. Paixão? Não! Tanto é verdade que os casais que são mais observadores de si mesmos dizem que estão apaixonados, e logo completam: "mas trata-se de uma paixão madura". Eles querem dizer o seguinte: a paixão mesmo, o que chamamos de paixão, foi o que já passou. Pois, se não passa, não é paixão.


Seria mais interessante que as pessoas que querem saber das paixões deixassem os "neuro-militantes" competir com a revista Caras, e isso é certo. Mas, quando quiserem saber mesmo da paixão, por meio de leituras, o melhor e ler coisas lindas e boas sobre o assunto, e isto é o que está na cultura universal com os filósofos, e se não gostar deles, vá aos romancistas, os bons. Machado de Assis, por exemplo. E porque não Ligações perigosas, de Laclos? Ah, mas você se diz "não culto", e quer coisas simples, por isso optou pela "neuro-leitura"? Mas há coisas simples mais úteis. Por exemplo, Júlia. Está nas bancas. É melhor.




Este artigo foi criado por LORD baseando-se em um trabalho acadêmico de autoria do Professor: Paulo Ghiraldelli Jr; Formado em Filosofia.


Nenhum comentário:

Postar um comentário